sábado, 28 de julho de 2012

Prólogo - Livro Tia Rafaela - Ed. Pandabooks

Nota preliminar

Pedofilia. P-e-d-o-f-i-l-i-a. PEDOFILIA.

Não gosto nem de sentir esta palavra passeando pelos meus lábios. Como pode existir
algo assim? – invariavelmente me pergunto. E de tanto me perguntar, concluo que o problema não é a palavra, mas tudo o que ela representa a mim.

Quando se fala em pedofilia, é comum imaginarmos sites pornográficos que exploram fotos infantis, casos absurdos de padres que abusam sexualmente de crianças, histórias de pais que molestam suas filhas. Em geral, o homem está no papel do doente, do criminoso.

O meu livro trata de um caso de pedofilia protagonizado por uma mulher.

Atualmente, a pedofilia é definida como doença, distúrbio psicológico e desvio sexual.
É caracterizada pela atração sexual de adultos ou adolescentes por crianças. Não é preciso, portanto, que ocorra relação sexual para haver pedofilia – o simples desejo já caracterizaria a doença.

Em 1996, um caso chocou a população da cidade de Belo Horizonte (MG). O cenário: uma pequena escola situada no bairro de Santa Tereza, na Rua Pouso Alegre. Os personagens: uma professora de educação física de 26 anos; e um menino, seu aluno, de 13 anos. O fato: ela era acusada de abusar sexualmente dele há pelo menos dois anos, conforme reportagem estampada na capa do jornal Hoje em Dia. Reportagem, aliás, que ia além. Não se limitava a alegar que a professora mantinha relações sexuais com o menino; afirmava que ela havia acabado de dar à luz um filho, supostamente do garoto.

Onde estavam a mãe e o pai deste menino? Sua família não percebeu o que acontecia em sua vida? Até que ponto um pedófilo é capaz de influenciar as decisões de uma criança? Um menino de 11 anos tem consciência de seus próprios desejos? Sabe medir as consequências?
Enfim, são inúmeras as perguntas que me fiz. Depois de ter vivido oito anos com a minha
professora de educação física.

Prólogo

“O Requerente e a Requerida se relacionaram sexualmente desde junho do ano de 1994, quando o Requerente contava apenas com 11 anos de idade e a Requerida com 24. Relação esta, fonte de grande polêmica na época e até hoje.
Em 22/12/1995, nasceu um bebê, fruto da relação entre o Requerente e a Requerida.

Na época a Requerida registrou, como sendo pai da criança, o ora ex-marido dela, dando a ele o  
o brenome do mesmo, pois na data do nascimento o Requerente contava com apenas 13 anos de idade. Se tivesse sido registrado em nome do Requerente estaria patente e provado, a ocorrência do crime de pedofilia e abuso sexual de menor.” (...)

Minha mãe se separou do meu pai quando eu contava 5 anos de idade. Fomos morar em Itaoca, praia de Itapemirim (ES), onde vivemos durante cinco anos. Quando retornamos para Belo Horizonte, voltei a ter contato com meu pai -– mas, admito, eu o sentia como se fosse um estranho, distante. Havia me acostumado a ter somente minha mãe e minha irmã ao lado.

Lembro-me com detalhes do meu décimo aniversário, em 1992. Minha mãe organizou uma festa-surpresa. O dia 15 de setembro cairia na terça-feira, mas ela resolveu antecipar a comemoração para sexta. Voltava da escola com alguns amigos, brincando de pega-pega. Ao chegarmos em casa, não acreditei no que via:

- Parabéns pra você, nesta data querida...

- Mãe, meu aniversário nem é hoje!

- Surpresa!

E seus olhos brilhavam bonitos de tanta felicidade. Mostrou-me tudo: brigadeiro, cajuzinhos, gelatina... O bolo, então, de dar água na boca, com cobertura de chocolate e jujubas. E lá estavam minha avó,  minha irmã, meus tios e primos. A festa ficou completa com a chegada de meus amigos da escola.

Lembro-me da lua iluminando o quintal, do céu estrelado, do barulho da brasa da churrasqueira fazendo um fundinho para a música da festa, o cheiro da carne no ponto.
Lembro-me que quando corria, brincando com os amigos, fui agarrado pela minha avó, que queria me dar um beijo. Seu perfume era inesquecível. Tinha cheiro de rosas frescas, daquelas que acabaram de chegar à floricultura, ainda úmidas pelo sereno. Um abraço gostoso, aconchegante. Queria que todas aquelas sensações nunca tivessem acabado. Mesmo com pouco dinheiro, minha mãe me fez muito feliz.

Na hora de apagar as velinhas, assoprei-as junto com minha mãe e minha irmã. Cortei o bolo fazendo apenas um desejo, sincero como só uma criança consegue: que o tempo parasse naquele instante de tanta alegria. Para que eu, minha irmã e minha mãe jamais nos separássemos.