Nesta semana, na nossa série de matérias sobre o Panorama Setorial da Cultura Brasileira 2011/2012 – pesquisa patrocinada pela Vale e Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet -, vamos falar sobre tipos de produtores culturais
A maioria dos 500 entrevistados se consideram realizadores de projetos (25%), responsáveis por tirá-los do papel, mas carentes de estrutura e apoio (22%), que acreditam que têm uma atividade difícil, que exige muita dedicação e esforço. 19% têm clareza sobre suas atribuições e se veem executando o trabalho com ética e postura profissional.
Mas os produtores culturais são iguais em atitudes e crenças?
Considerando como percebem a atividade, o mercado e seu próprio trabalho, a pesquisa propõe uma classificação em cinco perfis: o idealista (32%), o desiludido (28%), o alienígena (18%), o profissional (13%) e o produtor por acaso (9%).
O idealista acredita na cultura como meio de transformar a sociedade e acha que investir na área significa fazer arte. Afirma ter compreendido que grande parte da sua dificuldade em conseguir patrocínio para seus projetos é não conhecer marketing, comunicação e economia.
O desiludido vê as empresas como rivais e não como parceiras. Tem muita dificuldade na comercialização de seus projetos porque não compreende que há uma lógica para o patrocínio. Alega não ter tempo para planejamento e acredita que o produtor cultural tem que ser um bom executor de tarefas.
O alienígena tem a cultura como um meio de vida. Não entende a paixão pela profissão como essencial para exercê-la. Também não tem um posicionamento definido em relação ao mercado e se envolve pouco com investidores. Ele é o próprio negócio: exerce todas as funções, produtor, empresário e administrador, o que o leva a ter dificuldade em trabalhar com equipes.
O profissional compreende sua relação com o patrocinador, enxerga parceria. Acredita que o investidor entende o valor cultural e que está interessado em vários tipos de projetos e não apenas com o marketing da empresa. Mais voltado para o planejamento e menos para atividades burocráticas e operacionais.
O produtor por acaso começou na atividade por uma oportunidade. Viabiliza seu trabalho por meio da prática, do operacional. Assim, não valoriza o planejamento nem a formação acadêmica. Não exerga a cultura como um meio de transformação da sociedade, portanto é o menos envolvido com projetos que tenham continuidade.
Para Kuru Lima, diretor executivo da Cria! Cultura e diretor de programas como o Conexão Vivo, de maneira geral, existem esse diferentes tipos de produtores no Brasil. “Mas, como toda classificação e tentativa de enquadramento, possui limitações, não pode ser levada ao pé da letra. Há características mais acentuadas, tais quais as descritas, mas existe também nuances de cada perfil em cada produtor”, alerta.
Para ele, talvez não haja um produtor “puro sangue” dentre os cinco perfis sugeridos. “Dependendo do seu momento de vida e do projeto em que se encontra envolvido, cada um desses perfis pode estar mais aflorado. Acredito no profissional de produção em permanente processo de transição e evolução”, diz.
Erik Heimann Pais, assessor artístico do Conservatório de Tatuí, concorda. “Apesar de enxergar sim, em um primeiro momento, esses cinco diferentes perfis nos produtores culturais, tenho me deparado frequentemente com os que apresentam mais de uma das características ao mesmo tempo. Por exemplo, são comuns os contatos de produtores ‘idealistas-por acaso’ ou ‘alienígenas-desiludidos’”, conta.
Ele explica que, em geral, pela pauta do Conservatório de Tatuí não ser considerada atrativa comercialmente, mas sim como meio de promover o trabalho pelo circuito cultural-artístico do Estado, ele se relaciona constantemente com produtores idealistas e envolvidos em projetos culturais sem fins lucrativos, com alto índice de paixão e envolvimento com o projeto. “É notável a diferença entre os produtores dessa linha de atividade cultural com os produtores profissionais de artistas e/ou espetáculos comerciais.”
Contextos - Para Erik, produtores-artistas e produtores que possuem um envolvimento com o projeto que produzem são muito melhores de trabalhar do que aqueles que só visam o lucro que pode ser obtido pelo espetáculo. Por outro lado, os mais difíceis de trabalhar são aqueles que, apesar de trabalharem profissionalmente, não possuem formação, estratégia e muitas vezes, bom senso. “A imprevisibilidade advinda da insegurança do profissional que não sabe ao certo o que fazer, porém se esconde atrás do status de produtor, é de longe a mais perigosa para a boa execução de um projeto artístico-cultural”, alerta.
Para Kuru, é preciso olhar o ambiente, o contexto, o específico. “Assumindo que podemos classificá-los da forma sugerida, cada um deles terá um papel importante para um determinado projeto ou momento de um grupo artístico, comunidade, empresa”, afirma.
Ele aponta ainda que a implantação de uma ação, projeto, programa ou política cultural exigirá profissionais de produção com múltiplas inquietações e habilidades. Além disso, outras características interpessoais ou comportamentais podem ser igualmente importantes ou complementares, como resiliência, fidelidade e alteridade.
“Expertise não se limita ao universo da erudição. Não é melhor o produtor excelente em gestão administrativa e planejamento que aquele extremamente eficiente na execução de determinada função prática. Na maioria dos casos, são profissionais complementares. A complexidade está em alocar tais recursos e combiná-los corretamente, convocá-los para exercer determinados papeis aos quais se enquadram ou não, ou ainda, financiar projetos adequados a seus perfis.”
Ele exemplifica: um produtor que melhor se relacione e mais compreenda a dinâmica do investimento cultural privado, e, portanto, capaz de obter grandes financiamentos, pode não ser o que maior eficácia possua no atendimento de demandas culturais legítimas de um determinado setor cultural ou comunidade.
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