quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Escrevendo Um Projeto Cultural

Escrever um projeto sólido, adequá-lo às leis de incentivo, preencher planilhas, o caminho para a obtenção de financiamento para a realização de uma iniciativa cultural pede preparação e requer constante busca por conhecimento por parte do profissional da cultura. Em conversa com Alessandra Trindade, professora da Escola São Paulo de Economia Criativa e consultora em planejamento e implementação de políticas culturais, levantamos alguns pontos importantes que devem ser observados pelos produtores culturais ao redigir seus projetos.

Acesso – Que elementos chave um proponente precisa observar ao planejar dar forma a um projeto cultural?

Alessandra Trindade – Para formatar um projeto cultural o proponente precisa saber exatamente o que ele quer fazer, isto é, ter muito claro e definido o que é o projeto e qual a estrutura necessária para realizá-lo. E quando falo estrutura, tanto pode ser o material quanto os profissionais especializados em determinadas funções.

Por exemplo, ao formatar um projeto teatral, é importante que o proponente inclua a mídia desse projeto, pois a divulgação é fundamental para garantir público às apresentações que serão realizadas. Já vi casos em que o proponente concebe um projeto e, ao fazer o orçamento e considerar alto o valor final, corta itens fundamentais para a boa realização do projeto. Claro que alguns itens podem ser conseguidos por apoios, parcerias, mas não há garantias de que isso será conseguido, por isso o ideal é contemplar tudo na planilha de custos.

Acesso – A planilha é um dos pontos que mais geram dúvidas?

A. T. – Um projeto cultural que é encaminhado para aprovação nas leis de incentivo à cultura deve constar todos os itens. Caso não tenha itens importantes para a realização do projeto na planilha orçamentária, o proponente deve explicar como esses itens serão conseguidos – apoios que já estão garantidos ao projeto. Um projeto “incompleto” irá gerar dúvidas no profissional que irá analisá-lo e isso poderá dificultar ou até mesmo inviabilizar sua aprovação na lei.

Uma boa equipe também é muito importante. Há produtores ou proponentes que são centralizadores e querem fazer tudo, até mesmo para diminuir custos. Se são capazes de fazer tudo o que estão se propondo, não tem problema. Mas, se não tiverem experiência em algumas funções, deleguem isso a quem sabe fazer bem feito. Um projeto cultural, assim como qualquer outro projeto, deve ter uma equipe competente e capaz de realiza-lo.

Acesso – E quanto à adequação às leis de incentivo?

A. T. – Para a aprovação nas leis de incentivo, é importante que o proponente conheça bem a lei. As leis tem suas diferenças e é importante conhecer bem a lei para a qual está sendo buscada a aprovação do projeto. Por exemplo, há diferenças entre o ProAC, a lei estadual de cultura de São Paulo, e a Lei Rouanet. Todas as leis estão disponíveis na internet para que os proponentes e produtores tenham acesso e possam inscrever seus projetos corretamente.

Acesso – Qual a importância de uma formação específica em produção cultural?

A. T. – Em qualquer área, seja cultural ou não, o conhecimento é muito importante. Os projetos devem ser tratados como um “negócio”. Ao abrir uma empresa eu devo conhecer bem o segmento que pretendo atuar; no segmento cultural é a mesma coisa. O produtor cultural ou proponente é um empresário e deve pensar como tal, seu “negócio” precisa ser sustentável. Assim como uma empresa precisa do lucro para continuar existindo, um projeto cultural precisa ser sustentável.

Acesso – O currículo do proponente influencia a decisão do investidor?

A. T. – Se analisarmos os patrocínios culturais por meio das leis de incentivo vemos que as empresas querem direcionar seus patrocínios a bons projetos. Afinal, ninguém quer vincular sua marca a algo que corra o risco de não dar certo. Os patrocinadores buscam projetos de produtores que realizaram ou participaram de projetos que deram certo. O “nome que está por trás do projeto” é uma das principais referências de um projeto cultural.

Acesso – Para você, falta uma base de conhecimentos mais sólida para os produtores e gestores em geral? Quais as implicações disso em um contexto de entusiasmo com a indústria criativa?

A. T. – Os produtores e gestores tem sentido a necessidade de estarem atualizados com o mercado e, na minha opinião, tem crescido a busca por conhecimentos. O entusiasmo com a chamada “indústria criativa” tem sido um alavancador dessa busca por conhecimento. E busca por conhecimento não é apenas um curso ou uma capacitação. Temos visto cada vez mais publicações especializadas e também os blogs, como espaço para discussão e troca de experiências, tem tido um papel importante. Ainda tem produtor que não se vê como um empresário da cultura, mas esse grupo tem diminuído. Hoje quem está buscando inserção na indústria criativa e na cultura como um dos ramos dessa indústria sabe da necessidade de adquirir conhecimentos e estar sempre atualizado.

Acesso – E qual sua avaliação quanto à acessibilidade e à transparência das políticas públicas de incentivo à cultura?

A. T. – Aumentou muito a transparência das políticas públicas de incentivo à cultura e o poder público tem disponibilizado ferramentas para que elas sejam cada vez mais acessíveis. O Ministério da Cultura, por exemplo, tem realizado capacitações por todo o país para que gestores ou produtores culturais das mais diversas regiões possam utilizar-se dos benefícios de incentivo à cultura.

Há uma corrente que ainda é contra as leis de incentivo à cultura – incluindo aí produtores e gestores culturais. Mas é importante destacar que após a implantação dessas leis, principalmente da Lei Rouanet, houve um crescimento no volume de projetos culturais e o aumento da oferta cultural demonstrou que a demanda estava reprimida. Hoje, a cultura tem sido discutida pelo poder público, empresários, artistas, empreendedores culturais e o cidadão brasileiro estão cada vez mais conscientes da importância da cultura.

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